Diário de uma Enfermeira quarentona em tempos de pandemia: Parte III

Os dias avançam. Rápidos. As horas neste serviço são a correr. Contra o tempo. Contra o vírus desconhecido. Contra a Morte.

Os dias avançam. Lentos. As horas da normalidade não voltam. Quando voltam? Irão voltar? E quando voltarem vão ser como eram antes?

É este turbilhão de pensamentos que passam por todos os que aqui trabalham. Nos poucos momentos de convívio social, com os meus mais recentes colegas, são estes os temas das nossas e novas conversas.

Hoje escrevo para eles e com eles nos dedos do meu teclado.

Não somos muitos. Cerca de 20. A maior parte deles já faziam parte desta equipa, que passou de UCPA para UCI COVID 19. Comigo veio a Maria João, a Sónia e a Susana (somos as enfermeiras da Oftalmologia – o estar longe da área de conforto faz com que a nossa união cresça). Outros, vieram de outros serviços…

Estou com eles há 4 dias. Já decorei o nome de quase todos. Alguns conhecia-os de vista como o António, a Filipa, a Cláudia e a Sónia dos tempos de faculdade (confundo ainda a Diana com a Cátia, não sei muito bem quem é a Isabel e a Célia conheço-a pela altura… quem me dera ter aqueles 1,76 cm…).

Só lhes conheço o nome. Não sei mais nada. Se têm filhos; se são casados ou têm namorados; onde moram (pelo sotaque já percebi que o António é de Trás os Montes e a Carolina de Penafiel), qual a idade (pela proximidade do número mecanográfico o Daniel é quarentão…).

Mas isso pouco importa. Conheço-os pela Coragem, pela Determinação e pela Resiliência.

Coragem de estarem aqui. De passarem 8 horas com calor, a suar, com a visão enovoada, com dor no rosto pelos elásticos da máscara, com dor no nariz e na testa pela pressão dos óculos e da viseira.

Determinação em fazer aquilo que só eles sabem fazer. Cuidar. E Bem. De quem não respira sozinho. De quem tem dor por estar acamado. De quem sofre quando, já não está sedado, e apercebe-se que está numa cama de um hospital. De quem tem uma doença que à mínima distração e descuido os pode contaminar.

Resiliência. Os enfermeiros são resilientes. TODOS. E as greves dos últimos tempos demonstram isso mesmo pois nada muda e eles continuam aqui. Adaptam-se às mudanças como só eles sabem. Tratam a Pandemia com capas de Super Heróis que têm de vencer, custe o custar. E está a custar muito! Todos

estão longe dos seus. Alguns não vivem em casa, estão em quartos, sozinhos agarrando-se às chamadas virtuais. Outros estão separados dos filhos… como eu. E, no fim, são os que melhor superam estes obstáculos. São os que melhor correm maratonas e nos 100m não deixam cair barreiras.

Podem pensar que somos presunçosos. Mas, em Guerra, como esta, só assim se vence.

Nota sobre a autora

Chamo-me Joana. Tenho 40 anos e sou muitas coisas… filha, irmã, enfermeira, formadora…mas a mais difícil de todas… sou Mãe, Boadrasta e Mulher. Escrevo para libertar o que me vai cá dentro…

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5 comentários em “Diário de uma Enfermeira quarentona em tempos de pandemia: Parte III

  1. Até amanhã Deus vos proteja … que os vossos Anjos da guarda oa acompahem e às vossas familias . Eu peço para que todo este horror seja vencido e c/d um faça a sua parte ???

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