Tempo de Viagem

No tempo de ligação entre o ponto A e ponto B ela desfaz os seus nós. É nesse tempo que se pode dar ao luxo de apenas estar. Sem se preocupar. Um intervalo de tempo onde pode apenas existir e ser uma mera espectadora do que a rodeia.

É esse o único tempo em que não se cobra. Não precisa de correr, não precisa de procurar, não precisa de dar respostas. É só ela e o tempo a passar. A delícia de se poder apenas existir. Encostar a cabeça na janela e ver o mundo a rolar lá fora com a firme certeza que não precisa de intervir. Ser uma mera espectadora, sem ter de ser protagonista, ou atriz secundária…Na vida estão-lhe sempre a pedir que desempenhe um papel.

No tempo de viagem não precisa de o desempenhar. Tem apenas de ser a viajante.

É nesse momento que respira, divaga, reflete e se sente.

Todos os anos, as viagens longas, são muito mais para além do mero propósito de a levar a um destino. Servem de um período de contemplação e introspeção. Sem este escape, na espuma dos dias, não tem esses momentos. Há um sentido de alerta que não a liberta que a sufoca. Há na sua vida uma obrigação de estar em constante sentinela. Uma vigília constante.

É no tempo de viagem que baixa a guarda. O mundo continua a girar, mas ela fica suspensa no tempo de viagem.  Ficam apenas ela e os pensamentos. Arruma as gavetas da vida. Lê os livros do ano. Ouve a playlist do ano. Ou apenas comtempla o que a rodeia. O tempo de viagem é sobre ela e exclusivo para ela.

Não se cobra. Não exige mais velocidade, sabe que aquele intervalo de tempo está definido para ser seu. Para dormitar embalada pela banda sonora de um vida cheia de poucos espaços de tempo.

Quando nos permitimos, apenas, ser num tempo só nosso, revigoramos a alma.

Quando a viagem termina, fecha o livro, desliga a música, arregala os olhos e volta ao seu estado de sentinela. Arregaça as mangas e sai com a firmeza que os passos dados só dependem dela e da sua ação, por isso não pode abrandar.

Olha uma última vez para o se lugar…Um assento vulgar que daqui a nada será ocupado por outro viajante. Porém, olha-o como se um lugar de culto se tratasse. Agradece o conforto de ter tido um tempo de viagem em que pode baixar a guarda relaxar e divagar.

Levanta a cabeça arregala os olhos e volta o estado de alerta.

Nota sobre a autora

O meu nome é Inês Pina.

Sou uma marrona que não gosta de estudar, uma preguiçosa trabalhadora e uma fala-barato solitária.

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