Que livres tontos éramos nós

Estamos há mais de um mês trancados e impedidos de ser aquilo que sempre fomos, mas nem sabíamos: livres. Provavelmente nem pensávamos completar um mês de quarentena, confinados às nossas quatro paredes e sem aquilo que, sabemos agora, é o mais importante: o amor e o carinho dos outros.

Vêm-se agora mil e uma formas de demonstrar solidariedade e preocupação. Seja através de aplausos ou até na criação de equipamentos para combater este vírus. Crescem a cada minuto iniciativas de voluntariado, de forma ajudar o próximo e principalmente os mais necessitados.

No entanto, serão essas iniciativas suficientes para quebrar a barreira do isolamento e o silêncio que se impôs? Ou serão apenas uma tentativa de compensar tudo aquilo que não fizemos com a nossa liberdade?

Acredito que ser voluntário é a forma mais feliz de se viver, se não a mais bonita. Não nos torna melhores pessoas, muito menos perfeitas, mas torna-nos, com certeza, mais felizes. No voluntariado não se conquistam prémios nem grandes prendas, conquistam-se sorrisos e abraços. Mais que isso, conquistam-se pessoas e pequenas vitórias. E que tontos éramos nós ao achar que as grandes vitórias estavam nas coisas grandes, quando afinal estão apenas no abraço e no colo dos nosso pais.

Agora vemos que nada somos sozinhos e que a nossa felicidade não se rege pelo tamanho da nossa casa, pois ela é infinitamente pequena estes dias. Também não se  rege pelo carro que tanto trabalhámos para comprar, pois temo-lo há dias fechado na garagem. Agora sabemos que tudo aquilo que precisávamos era de um abraço que não tem meio de chegar e da saúde que não conseguimos comprar.

Talvez agora até vejamos no voluntariado um escape e uma forma de aliviar a nossa cabeça, talvez até seja o chamado “ocupar tempo”. Mas não teremos nós, agora, a melhor oportunidade para acordar e pensar que não vivemos sozinhos? Que o mundo precisa de nós e que as pessoas em risco sempre existiram? Que os médicos sempre mereceram o nosso aplauso e que o senhor do supermercado era afinal a pessoa que iria garantir a nossa mesa cheia?

Que ao fim deste mais de um mês de isolamento, não sejamos aqueles que se lembram apenas quando tudo está mal. Não batamos palmas apenas quando precisamos que nos salvem de um vírus. E, principalmente, não façamos da vida dos outros um passatempo. A vida dos outros é, como se vê agora, o grande valor da humanidade e sem ele nunca seremos livres.

Ana Rita Santiago

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