Peças do puzzle

A vida é mais ou menos como um puzzle. Não conseguimos perceber no imediato como é que vai ser, como é que vai parecer. Nem sempre conseguimos encaixar tudo à primeira. Às vezes precisamos de várias tentativas até conseguir. Conseguimos ter uns vislumbres à medida que vamos contruindo, pouco a pouco. Todas as peças são diferentes e nenhuma pode ser substituída por outra. De forma nenhuma. O problema é que ninguém nos prepara para o vazio de quando começamos a perder algumas peças. Ninguém nos prepara para o que vem a partir disso.

Ninguém te prepara para perceber como é que o mundo vai continuar a partir dali, a partir daquele vazio. Ninguém te prepara para perceber porque é que o mundo continua igual, quando tu não podes continuar. Ninguém te prepara para perceber porque é que, no momento em que tu ficas sem chão, as pessoas ainda continuam a ir dançar. Não percebes porque é que continua a haver festas, porque é que os outros ainda podem ouvir música e dar gargalhas muito alto, quando o único som que consegues ouvir é o da tempestade à tua volta. Ninguém te prepara para perceber porque é que o sol continua a aparecer todos os dias. Ninguém te prepara para perceber porque é que continua a amanhecer todos os dias. Ninguém te prepara para perceber porque é que o Verão ainda chega. Não percebes porque é que o Natal ainda chega, porque é que os aniversários ainda chegam. Ninguém te prepara para perceber porque é que as pessoas continuam como se nada se tivesse passado. Como se o mundo estivesse completamente igual. Quando o teu mundo mudou para sempre.

Não percebes porque é que o mundo não parou ali mesmo. No mesmo momento em que o teu.

Depois os dias passam, os meses passam, os anos passam. E então percebes. Finalmente percebes. Percebes que o mundo não parou para que tu não parasses também. Percebes que o mundo continuou para que pudesses continuar com ele. Percebes que as festas acontecem para te provar que dançar ainda pode ser bom. As pessoas ainda ouvem música alta e as discotecas ainda enchem para que percebas que não faz mal se quiseres fazer parte disso. Percebes que as pessoas ainda se riem alto para te fazer ver que estar com os amigos ainda é um prazer. Percebes que as gargalhadas te mostram que ainda te podes rir.  Percebes que o verão chega para te mostrar que ainda há dias bonitos. Que o Natal chega para te relembrar que a família junta à volta de uma mesa continua a ser uma das melhores coisas da vida. Começas a perceber que os aniversários continuam a chegar porque merecem, mesmo, ser celebrados. O mundo continua igual para que nunca te esqueças que, mesmo quando te faltam peças, continua a haver coisas boas e bonitas. Percebes que o dia amanhece e o sol nasce para que te lembres, todos os dias, que o som que podes ouvir já não é só o da tempestade.

Entendes, finalmente, que o mundo seguiu para que seguisses também. Entendes, finalmente, que o puzzle nunca mais vai ser o mesmo. Mas também entendes que, apesar disso, o teu mundo pode continuar a ser bonito. Ainda que aquele espaço vazio nunca se preencha. Percebes que vai faltar sempre alguma coisa, mas que a podes manter viva enquanto continuares a construir o puzzle e mantiveres contigo a imagem de quando estava completo.

 

Marta Pires

 

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