O mundo segue veloz

O mundo segue veloz sem direção. Como um louco.
Corremos sempre para alguma coisa sem tempo. E deixamo-nos para trás. Esquecemo-nos de nós e do que realmente importa; a família, os amigos e a saúde.
E é sobre saúde que vos escrevo. Sobre saúde mental, para ser claro.

Depois de meses de negação, há alguns dias fui ao médico. Ao psiquiatra.
Sabia que qualquer coisa de errado estava a acontecer comigo. Dentro de mim. Na minha cabeça. Havia demasiadas vozes a quererem ser ouvidas e inconscientemente escolhi sempre ouvir as que diziam “coisas feias”, muito feias. E as repercussões foram sempre ainda mais feias.
O médico disse que sofro de stress pós traumático e patologia de pânico, e que se tivéssemos de nivelar o meu estado seria um 4 numa escala que finda no 5. Uma merda, portanto.
Disse que eu seria “alérgico” ao medo para o resto da vida.
É por isso que tenho ataques de pânico. É por isso que tantas vezes perco o controlo do meu corpo ou me dói o peito sem razão. Quer dizer, agora sei a razão. É por isso que às vezes me sinto triste, tão triste que as pernas não se mexem e não consigo explicar de onde vem tamanha tristeza.
Não vos falo dos motivos que me levaram a chegar a este lugar. Não são relevantes, pelo menos para vocês que me lêem. São meus. E para vos ser honesto, são gavetas que não gosto de abrir.

Até àquele dia achei que estava a ficar louco.
Mas quero deixar claro que ter qualquer tipo de transtorno mental não é sinónimo de sermos malucos. Significa apenas que podemos sentir dor sem ninguém conseguir ver a ferida. E dói. Dói mesmo. E às vezes não conseguimos concretizar o sítio ou detalhar a dor. Só sentimos que dói.
Paralelamente a isto sou um sortudo, com uma verdadeira vida de sonho. Tenho a melhor família do mundo, os melhores amigos e um namorado para quem me faltam as palavras na hora de falar dele. É demasiado bom. Quase irreal. E profissionalmente sou verdadeiramente feliz e bem sucedido.
Mas hoje sei que o que está dentro de nós, o que sentimos, é tão importante quanto aquilo ou quem nos rodeia.
Querer partilhar isto não me faz sentir fraco e garanto-vos que não é uma forma de chamar à atenção. Mas é um alerta e uma mão aberta para vos mostrar que não estão sozinhos.
Sei-vos envergonhados, sei-vos com receio de um diagnóstico semelhante. Também eu tive medo do que o médico me iria dizer e vergonha ainda sinto. Mas é connosco que vamos ter de viver para o resto da vida.
Que por um segundo consigam calar as tais vozes que dizem “coisas feias” e peçam ajuda.

Repito; a minha vida é óptima e tenho um trabalho de sonho. Mas paralelamente a isso, sou humano. Tal como qualquer um de vocês.
Este poderia ser um texto bonito para vos falar do quão sugestiva é a minha profissão. Podia ser uma foto minha com um outfit assinado por algum designer.
Mas não.
Este texto sou eu. Ou pelo menos uma grande parte de mim, por agora.

 

Nota sobre o autor

Mário de Carvalho. 23 anos . Celebrity Stylist.

Senti que o devia fazer. Sei que não o único a passar por isto.

E sou consciente de que saúde mental deve ser a maior discussão social do tempo atual. Porque é um tabu. Porque as pessoas têm vergonha. Porque se sentem malucas.

E para mim, também foi um tabu, ao início. Tive vergonha, ainda hoje tenho, e senti-me maluco.

Mas escrevi isto para mostrar que por detrás de alguém que aparentemente tem uma vida de sonho, rodeado de um mundo de fantasia, está alguém normal.

Partilhe nas Redes Sociais
FacebookTwitterPinterest

8 comentários em “O mundo segue veloz

  1. Tenho uma filha com uma situação identica. Eu como mãe sofro muito de a ver, ora bem disposta ora quase que mete a cabeça na areia. Gostei do seu depoimento. Obrigada coragem

  2. Porque nada é mais forte que tu… Porque tu e só tu tens a capacidade de te auto conheceres… Porque tu sem reservas te expões assim… Porque não interessa o que cada um acha que sabe sobre a nossa pessoa, a nossa vida… Porque tu és fantástico… Porque tu és meu irmão… Porque és parte de mim… SEMPRE AQUI…

  3. Crises de pânico…. Tenho 42 anos e tenho sofrido essa dor desde os 16 anos…. Sim, há 26 anos!!! Lembro me que
    essa altura houve médicos que me olharam de lado, pois
    ninguém falava sobre isto. Era tabu. E tentavam arranjar diagnósticos onde não os havia. Depois…
    Muitas horas de terapia…. Muitas opiniões ouvidas, muitas experiências foram feitas….
    Há cerca de 3 meses encontrei o caminho….. Hipnoterapia de seu nome, com uma fantástica terapeuta, Dra. Fátima Neves, também psicóloga.
    Aconselho vivamente.
    E agora…. Quero mesmo é ser feliz.
    Experimente!

  4. Excelente descrição. Não te inquietes Mário, não estás sozinho. Mesmo ao teu lado há pessoas que sofrem o mesmo que tu e vão aproveitando a vida à sua maneira. Aprende a fazê-lo e serás às vezes feliz, como todos os outros.

  5. Parabéns por pôr por escrito o k tantas vezes se sente dentro do peito.. calados !! Deus te abençoe .Obrigada Rita por trazer até nós mais um tema e reflexão. Excelente o seu trabalho .

  6. Falar de saúde mental é dos maiores desafios da humanidade. Enquanto profissional na área louvo a coragem! E que mais tenham essa coragem de dizer que recorrer a um profissional ou serviço da área não é ser maluco! Se partirmos a mão não vamos rapidamente ao hospital? Qual é a diferença.?
    Um abraço

Deixe uma resposta

* Campos obrigatórios