Globalização vs glocalização

Iniciamos a nova década com um grande desafio. Temos de virar a página!

As últimas décadas foram vividas de uma forma desenfreada. Esventrámos com requinte cada recurso natural do planeta. Tornamos solos pouco férteis. Bebemos de forma sôfrega cada litro de água potável do planeta. Vivemos como se tudo fosse infinito, quando já sabemos da finitude de tudo!

Muitos podem pensar que esta situação de pandemia nos vai atirar para um déjà-vu dos loucos anos 20 do século passado. Porém, nestes últimos tempos temos vivido até à exaustão um modelo que precisa de revisão urgente. Há um forte desequilíbrio da balança. Por isso, precisamos de desacelerar, não de entrar em loucuras. À medida que aumentamos a riqueza mundial, multiplicamos a pobreza. A primeira beneficia apenas um nicho, a segunda atinge milhões!

Se há coisa que a anterior crise económica nos mostrou é que o modelo que nos regia há muito que precisava de ser revisto. Porém, foi-se aligeirando o discurso, silenciando revoltas, e claro, os mais afetados, quase sem voz, nem sequer fizeram eco. Posto isto, lá se foi empurrando mais uma década neste sistema moribundo.

Enchemos o mundo, atafulhamos cada recanto com pessoas e bens materiais. No fundo, capital criado pelo homem, para o homem. Instituímos um modelo que nos diz que o sucesso da sociedade é fruto da acumulação dos sucessos individuais. Isto é, cada um é responsável pela sua jornada que deve ser próspera e centrada na sua subida. Vendeu-se a ideia que chegar ao topo significa felicidade. Porém, muitos não leram as letras pequeninas do contrato, que nos diziam que no topo acabamos por nos isolar num frasco de vidro muitas vezes hermético e sem oxigénio. A caminhada feita de forma solitária para que se alcance rapidamente o topo, sufoca-nos. O excessivo foco em nós, atira-nos para o abismo.

Durante décadas fomos caminhando no caminho da globalização. Um todo construído com a soma das partes. Porém apenas globalizamos uma parte do mundo. A outra ficou esquecida. É mais ou menos como as coisas lá em casa, para que a sala e o quarto estejam bem clean e funcionais atiramos com toda a bagunça para o compartimento da casa que está sempre de porta fechada.

A grande questão é que a porta fechada não é solução.

A globalização não significa o fim do local, enquanto realidade social. Pelo contrário, deve ter-se sempre presente a natureza dialética da globalização, enquanto processo assente na interação do global e do local. O nosso grande erro foi usar o escudo da globalização e avançar para um processo destruidor da ideia de local ou de localidade. Esse foi o nosso primeiro erro. Para obter o sucesso avançamos de forma solitária, sem envolver os outros. Esquecemo-nos que o conceito de globalização convoca a ideia de uma forte e intensa conexão do local e do global, associada às profundas transmutações da vida quotidiana, que afetam as práticas sociais e os modos de comportamento preexistentes. Não há uma receita única que produza sempre os mesmos resultados. Nenhuma receita é infalível.

Os conceitos de “glocal” e de “glocalização” pretendem transmitir a necessidade de uma leitura atenta da complexidade da relação local-global, na qual a mundialização da economia e a revolução do digital desempenham um papel determinante. Está na altura de fazer uso destes novos conceitos, de os introduzir no nosso quotidiano. O sucesso não pode ser apenas de alguns, tem de ser de todos.

Nós somos seres de relações (a esta altura já percebemos esta premissa, certo?) por isso não podemos embarcar na caminha do sucesso de forma solitária, se formos todos juntos vamos chegar mais longe!

Nota sobre a autora

O meu nome é Inês Pina.

Sou uma marrona que não gosta de estudar, uma preguiçosa trabalhadora e uma fala-barato solitária.

Partilhe nas Redes Sociais
FacebookTwitterPinterest

Deixe uma resposta

* Campos obrigatórios