Esta é a minha luta: o dia

Deitada na cama no hospital, esperava que me viessem buscar para o bloco. Estava pronta, andava-me a preparar para este momento há 8 anos. Estava ansiosa mas confiante como nunca. Não sei explicar. Tentei animá-los. Fotografias e piadas para mais tarde recordar. E quando chega a hora, o teu corpo ganha vida própria e treme sem parar. Descontrolado. À medida que me afastava, via no olhar deles o mesmo: amor. Adormeci na anestesia a pensar nesse amor todo. E acordei depois. Inteira. Sem as sequelas prováveis. Mas já não era a mesma. Nunca mais seria. A certeza do que sempre pensei durante toda a minha vida ganhava agora mais força: o amor cura tudo! Cura mesmo. Seja qual for o desfecho da história, o que ele faz nesse caminho, contigo e com os teus, não tem descrição.

Enquanto esperava para entrar no bloco conheci o João. E essa foi uma das primeiras lições que tenho aprendido neste ano. O João estava ao meu lado e tinha 7 anos. Também ia ser operado a um cancro no cérebro. Estava assustado com aquilo tudo e meti conversa com ele (é mais forte do que eu). Falamos de super-heróis e de salas mágicas e de como tudo ia correr bem. Lembro-me de olhar para os pais do João com admiração. Eles estavam ali, inteiros, firmes, para o filho. Penso no João e nos seus pais muitas vezes, com o desejo que ele esteja bem. Isto para dizer que há um ano, como todos os dias, várias pessoas passam por situações difíceis. E toca a todos. Portanto, resta-nos celebrar a vida.

Tive uma recuperação ótima, em 48 horas estava em casa. Foi sempre esse o meu pensamento. Voltar rapidamente para eles. Ainda nos cuidados intensivos, horas após a cirurgia ter terminado, perguntei ao meu médico o que era preciso acontecer para a alta. Ele olhou para mim meio incrédulo e sorriu. Fiz tudo o que era necessário. Ele disse-me para ter calma e que muitas vezes nos dias seguintes os doentes se iam abaixo porque ganhavam consciência do que estavam a viver. Agora foi a minha vez de sorrir. Lembro me de lhe dizer “percebo, mas isso não vai acontecer comigo”. E não aconteceu.


(continua)
Irina.

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2 comentários em “Esta é a minha luta: o dia

  1. Querida Irina, só hoje, e após ver o post no instagram da tua irmã resolvi visitar o site elefantedepapel. E descobri hoje, aqui com o meu bebé ao lado em família, na praia mais ao pormenor a tua história. Se por um lado senti aquele aperto no coração e as lágrimas vieram-me aos olhos, por outro, senti e soube que uma história de vida destas cheia de coragem e positivismo só poderiam vir duma pessoa como tu.. És de facto aquela menina, agora mulher cheia de garra que conheci. E lendo as tuas palavras como mãe, não consigo se quer equacionar essa luta e força interior perante uma situação como a tua…Mas ums coisa tenho a certeza, e agora, que também sou mãe, o amor nunca falha!!
    Um grande beijinho minha querida Irina que a tua história seja e continue a ser uma inspiração para quem infelizmente é “apanhada” por esta execrável doença.

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