Erro

Lá vai ele. Despido de tudo e por isso nu. Atravessa o longo corredor com as partes pendidas e o chicote na mão direita. Os seus dez servos impávidos ao longo do corredor nada lhe dizem. Nem tampouco os olhos mexem, condição de serventia. Entra dentro da sala, ao fundo. Ouvem-se as chicotadas. De quando em vez um gemido de dor sufocado.

– Que no epitáfio deste homem se deite algo gongórico, ou sardónico se melhor, mas que se fuja à normalidade que em nada o dignificaria. Que se façam apoteoses a homens que destas coisas se lembram – disse o mais antigo servo.

Chicotadas passadas, fez o caminho inverso com as partes pendidas, o chicote na mão direita e as costas de sangue cobertas pela cútis em farrapos.

– O que lhe vai no miolo para se deixar em sangue? – questionou o mais novo servo.

– É por conta dos sonhos. A cada vez que o sonha, chicoteia-se.

– Não controla um Homem o que sonha!

– Crê que, se castigar o inconsciente, haverá dia em que o aprenderá. É sonho de amor. Não há outra cousa que um homem enlouqueça! Fugiu ela com outro…

– É isto porque não a perdoa?

– Isso seria pensar para fastidiosos homens comuns. Não é a ela que ele não perdoa. É a ele por com ela sonhar. Chicoteia-se pelo erro imperdoável do sonhar.

– Sonhar é um erro?

– Para ele! Engana o consciente, mas ao inconsciente não. Quando lhe mostra ele a fugitiva… já o sabemos nu e em sangue por este corredor.

– A ela é que devia ele chicotear!

– Disse-me ele quando isso lhe disse: Homem que os outros quer dominar é acéfalo. Homem que a si se domine será tanto quanto quer. É o sonho meu maior erro. Haverei de chicotear-me até que um de nós se desfaça.

Nota sobre a autora

Nicolau Benjamim, pseudónimo de Gabriela Pacheco.

Gabriela tem 29 anos e é Gestora de Formação.

Nicolau é outra coisa, a melhor: é sonho, é palavras… na pele, na alma e no corpo. Escreve por inevitabilidade.

Escreve aqui:

@benjamimnicolau @gabriela_._pacheco

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