Do vazio

Ouvi esta semana no podcast do Salvador Martinha, “Ar Livre, a sua reflexão sobre o vazio. Adoro quando um podcast me inquieta, quando me fica na mente para lá dos seus minutos de duração. Acabei por refletir sobre o repto que foi lançado.

Quem somos nós no vazio?

Percebi o quanto é angustiante o conceito de vazio nas nossas vidas.

Somos uma moldura que nunca pode estar sem fotos, e de preferência nunca deve ter apenas uma foto. Todos os dias nos lembram que a nossa moldura deve estar sempre preenchida!

Estar vazia, não é visto como uma pausa para ver o que melhor se enquadra nela, mas sim que está VAZIA! Emolduramos muito mal o vazio.

Quem sou eu quando esvazio o saco que os ditames sociais enchem? Quem sou eu sem as ideias que tenho de ter a cada cinco segundos? Quem sou eu sem um novo projeto? Quem sou eu sem um, ou dois projetos na gaveta? Quem sou eu para além da profissional? Quem sou eu para além da filha, da irmã, da namorada, da amiga?

Quem sou eu no vazio?

As molduras vazias não contam histórias, por isso delas não reza a história.

Somos pelo preenchimento, para que não nos saibamos vazios. Tememos o vazio, não nos permitimos ao mesmo. Quando ele nos toca, nós fugimos. O vazio não é visto como importante para nos mostrar a nossa essência. Pelo contrário, mostra a nossa inutilidade numa sociedade que só valoriza a produção constante. É um jogo de regras bem definidas. Não podemos parar para existir no vazio. Temos de estar constantemente a batalhar para preencher esse espaço em branco.

O eu, sozinho, na simples ascensão do ser não o preenche. Quem o preenche é o que se vai obtendo.

Sempre o ter!

Seja a família que construímos, a carreira que edificamos, as amizades que criamos, a casa que possuímos…. No fundo, o vazio é preenchido por um conjunto de aspetos que nos ensinaram que é suposto preencherem-nos. Temos de preencher cada instante, cada momento, com projetos, com família, com exercício, com meditação, com sumos verdes, com hobbies. Temos de adornar a moldura, nunca a podemos apenas pendurar e deixar que esta reflita a parede atrás de si.

Quando nos despimos dos mesmos, ficamos sempre com a ideia de que nós, por nós mesmo, nunca somos suficientes!

Não ser suficiente é devastador. Vivemos numa época em que a sociedade nos define por tudo aquilo que alcançamos.

Não ser suficiente é vestir uma capa, não de herói, mas de invisibilidade. O vazio, diz-nos que não somos ninguém.

Numa era de exposição constante ser invisível é ser vazio. Numa era de exposição, ser vazio é não ter lugar… Ninguém gosta de ver apenas a moldura.

Nunca nos disseram que ser, simplesmente ser, já é uma grande conquista. Respirar, estar, ser, no fundo, existir…são tudo tarefas que dizem que devemos fazer em modo piloto automático.

 Não!

Existir é complexo, dói e exige muita energia. É por isso que devíamos fazer as pazes com o vazio e cultivá-lo mais. Tal como antes de entrar em apneia enchemos os pulmões de ar. Também o vazio deveria ser visto como o momento em que mergulhamos para nos reconectar com a nossa essência para que possamos voltar mais cheios e completos.

Nota sobre a autora

O meu nome é Inês Pina.

Sou uma marrona que não gosta de estudar, uma preguiçosa trabalhadora e uma fala-barato solitária.

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2 comentários em “Do vazio

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