Como sobreviver a uma road trip em Marrocos (parte I)

 

 

Num impulso, decidimos ir a Marrocos e, 6 horas depois de ter brincado com a ideia, tínhamos tudo reservado e partíamos em 7 dias. Gostamos de construir as nossas férias, combinar praia e cidade, cultura e diversão, de escolher os hotéis e atividades, por isso não recorremos a agências de viagens. Sendo um país africano, alguns cuidados especiais são necessários, por isso, se quiserem ir “à maluca”, aconselho que leiam este artigo e, sempre, antes de fazerem qualquer reserva, os comentários dos utilizadores no Tripadvisor, Trivago, Booking ou Hotels. A grande vantagem, face a outros destinos semelhantes, é não ser precisa vacinação especial, nem a profilaxia da malária. No blogue “Rita em Marrocos” encontram explicações e dicas imprescindíveis, e, se preferirem não ter que trabalhar para as férias, podem contratar a Rita para organizar a vossa viagem. No blogue “Nomad“, encontram o relato de uma road trip fantástica por Marrocos com várias descrições e sugestões (aqui também). O primeiro conselho para quem quer ir à descoberta é simples: memorizem o mapa de Marrocos e acreditem: parece tudo perto, mas é tudo longe!

Optámos por chegar de avião a Marraquexe e fazer a costa oeste de Marrocos de carro, primeiro até Fez, depois até Saïdia, a zona balnear, e no final, o regresso para Fez, onde apanhámos o avião de volta para Lisboa. Foram mais de 15 horas de carro e mais de 1000 quilómetros de estrada (é fundamental ter ar condicionado no carro). Não é difícil andar de carro (fora das cidades) em Marrocos, já que entre as grandes cidades existem boas auto-estradas (com zonas de serviço em cada 20 a 40 quilómetros). No entanto, quando o google maps diz que levam 5 horas a fazer 300 quilómetros, acreditem. É que as auto-estradas “passam” apenas pelos arredores das cidades e as ligações são feitas por pequenas estradas, algumas em zonas de montanha, onde se circula muito devagar. Infelizmente, a minha expectativa idílica de ir parando para pequenas visitas revelou-se absurdamente ilusória. Se quiserem sair da auto-estrada para visitar uma cidade mais importante (como Casablanca ou Rabat) contem com 1 hora de estrada secundária e trânsito interno para entrar na cidade e outra hora para sair. Quanto a pequenas cidades pelo caminho… Na zona norte interior de Marrocos, não valem a pena. Há dezenas de pequenas cidades e aldeias, é certo, muitas visíveis da estrada, mas são todas iguais, degradadas, construções de tijolo castanho simples e, basicamente, nada para ver. Como Marrocos é um dos poucos países islâmicos não arábicos que não permite não fiéis dentro de Mesquitas, nem estas podemos visitar. Vale mais a pena fazer este tipo de viagem na costa atlântica, pois as cidades costeiras são bonitas. Ainda assim, os voos locais são muito caros (são operados apenas pela Royal Air Maroc), por isso é mais económico ir de carro.

Alugar um carro em Marrocos é toda uma aventura de paciência e cautela. Vão ler em vários sites (e em inúmeros comentários de utilizadores, mas aconselho que leiam este bloque primeiro) avisos contra tentativas de burla e fraude, por isso sejam prudentes. Escolham uma empresa de aluguer de carros internacional (as mais representadas são a Hertz, Avis e Sixt, nós optámos pela Sixt, através do Holidayautos, e fomos muito bem tratados). Não escolham o preço mais barato, pois parte do preço final é fixado no balcão, só descobrem o valor real quando chegarem (o “barato” pode-vos sair muito caro). Como os acidentes dentro das cidades são muito frequentes (mesmo!), as companhias exigem entre 500 a 1000 euros de caução, que pode ser paga com cartão de credito e é devolvida à entrega do carro (guardem os talões todos, verifiquem todas as facturas, leiam bem os contratos e vão vendo nos vossos extratos se há cobranças indevidas).  Se entregarem o carro numa cidade distinta da recolha têm de pagar a taxa “one way”, que quase duplica o valor do aluguer, e é um dos valores pagos no balcão.

 

(Nouvelle zone touristique – Marraquexe)

Como é muito difícil pedir indicações – vão perceber mais à frente – e nem sempre as placas são claras, é fundamental ter acesso à internet. Podem pedir o extra de GPS, mas como o preço é igual ao de um Hotspot, esta opção é mais rentável, já que vos permite ter acesso ao google maps dentro e fora do carro (acreditem, vão precisar do google maps para visitarem as medinas, que são os centros históricos das cidades marroquinas). Caso pretendam ter hotspot ou GPS garantido, incluam o GPS no formulário online e peçam para trocar no balcão de recolha do carro, pois a opção hotspot não está disponível online, mas costuma haver no balcão. Outra opção ainda mais rentável – até porque os hotspots tendem a falhar (tivemos de devolver o nosso ao fim do 2.º dia, felizmente a Sixt foi impecável, fez-nos um reembolso integral e ajudou-nos a obter o cartão carregável) – é utilizarem um cartão pré-pago marroquino. À chegada ao aeroporto é vos oferecido (mesmo, é gratuito) um cartão pré-pago com, supostamente, 20 euros em conversas locais (na verdade, são cerca de 5 minutos, utilizem só para chamadas fundamentais, por exemplo, para as Riads, se optarem por este alojamento, vão precisar). Podem carregar o cartão com 50 ou 100 gigas de internet (5 ou 10 euros, respetivamente) na papelaria do aeroporto (e em qualquer papelaria local), o que vos dá perfeitamente para 5 ou 10 dias (e sobra). Não se esqueçam, para terem esta opção, têm de levar convosco um telemóvel desbloqueado! Assim, em vez de gastarem 50 euros para 8 dias de internet, gastam apenas 5 ou 10 euros.

O euro é largamente aceite em Marrocos (mesmo em algum comércio de rua, embora seja comum darem-vos o troco em moeda local). Para evitarem taxas e terem o maior rendimento, levem euros de Portugal (levem a quantia que considerem necessária, mais cerca de 20% para alguma emergência). Podem trocar euros por dirhams (moeda marroquina, lê-se dir-ram) no aeroporto, mas conseguem taxas melhores na medina em Marraquexe (ou qualquer posto local na cidade). Os valores rondam os 10-11,5 dirhams por 1 euro, por isso é muito fácil fazer contas. O ideal é trocarem apenas um terço do dinheiro por dirhams, já que vão poder fazer muitos pagamentos em euros e conseguem melhores negociações. Se for preciso, há sempre postos de câmbio. Peçam uma parte em notas e moedas pequenas. Em alguns locais – hotéis, restaurantes maiores e bombas de gasolina nas auto-estradas – têm ainda a opção de pagar com cartão de crédito diretamente em euros.

Se não têm no vosso grupo alguém que fale razoavelmente francês, estão em desvantagem. A esmagadora maioria dos marroquinos (mesmo nos operadores turísticos) não fala inglês (de todo). Nas zonas mais rurais, nem mesmo o francês ajuda. Como os marroquinos são muito simpáticos e têm a tendência para dizer que sim a tudo, mesmo quando não perceberam nada do que vocês disseram, as comunicações podem tornar-se surreais muito rapidamente. Se ninguém se desenrascar no francês, preparem a paciência, ou a carteira (o mais provável, ambas): a probabilidade de serem “enganados” em qualquer coisa é exponencial, e é melhor contratarem guias nas medinas.

Por fim, convém não esquecer que estão num país de maioria islâmica, em que mais de 50% das mulheres usa o véu. Não é suposto que as turistas usem véu (nem podem entrar nas mesquitas, com ou sem véu), sendo até desrespeitoso que usem o véu por meras razões estéticas, já que se trata de um símbolo religioso. Porém, não é adequado usar roupa demasiado decotada ou saias/calções demasiado curtos nas medinas, principalmente para as portuguesas que, como eu, parecem marroquinas (acaba por atrair alguma atenção indesejada, mas nada ameaçador). Nunca fomos assediadas, mas porque não é tão habitual ver mulheres com roupas mais reveladoras, é normal que os homens olhem muito ou fiquem parados a olhar. É possível, porque sei que há quem se queixe de algum assédio, que o à vontade natural dos marroquinos com o toque seja mal-entendido. Enquanto na Europa evitamos tocar em desconhecidos numa interação social (numa compra, numa fila, etc.), eles e elas (mesmo mulheres de véu) convivem naturalmente com a proximidade e o toque físico, sendo muito comum darem-nos a mão, segurarem-nos na mão numa troca de dinheiro, ou colarem-se a nós numa fila ou multidão. Não é com maldade ou segundos sentidos, para pode dar origem a episódios de “lost in translation” cultural. Existem algumas regras que devem cumprir quanto às mulheres que usem o véu:

 – Não ficar a olhar estupefactamente. É uma mulher, normal, como qualquer outra, mas de véu.

 – As mulheres que optam por usar o véu seguem à letra os ensinamentos de modéstia e reserva que são esperados da mulher no Islão. Por isso, não podem estar sozinhas num local fechado com um homem que não seja da família, nem devem falar, sozinhas, com homens que não sejam da família. Se forem homens ou fizerem parte de um grupo só de homens, o melhor é não abordar uma mulher de véu que esteja sozinha (é provável que não responda). Não estranhem que uma mulher do véu saia do elevador se entrarem ou se recuse a entrar convosco. Não é pessoal, simplesmente não podem estar num local fechado, sozinhas, cum um homem (ou mais) que não seja da sua família… Sim, isto torna a gestão dos elevadores complicada num hotel cheio de gente.

 – Se forem à piscina ou à praia, vão ver várias mulheres de burkini, dentro e fora de água. Estão no seu país e no seu direito (para muitas foi mesmo uma escolha, por mais inacreditável que pareça), independente do que possamos achar sobre o uso do véu integral. Os burkinis são feitos de material próprio para utilização na água e não geram qualquer risco de segurança ou de saúde para terceiros, por isso não há razões para se incomodarem.

 – Sejam simpáticas (reagem melhor à abordagem de mulheres) para as mulheres de véu. Já é castigo suficiente estarem cobertas de lenços com 45 graus e nunca poderem sentir a água a passar no corpo ou apanhar sol nas pernas. Não precisam dos olhares censuradores dos europeus.

 

Marraquexe

Se chegaram até aqui e ainda têm vontade de ir a Marrocos, é provável que adorem Marraquexe! É a melhor cidade ponto de partida para experimentar um pouco de tudo: cultura, tradição, comida, calor e deserto.

Se estão de carro, preparem-se: conduzir nas cidades é uma loucura. A regra é o salve-se quem puder, não se respeitam faixas e não há piscas. A única coisa que é respeitada (mais ou menos) são os semáforos, e convém mesmo respeitar (devem parar logo no amarelo) porque as ruas são muito policiadas e qualquer desculpa é boa para serem parados pela polícia. Se forem parados pela polícia (muito provável, há inúmeras operações stop), é possível que vos seja oferecida uma “solução criativa” para uma eventual infração que tenham cometido. Se o polícia vos disser que, por serem turistas, está disposto a fechar os olhos desta vez, ouçam com atenção e sigam o seu conselho… A boa notícia é que andámos 9 dias a conduzir em Marrocos, sempre com muito cuidado, a dar passagem, a parar nos amarelos e a cumprir todos os limites de velocidade, e conseguimos não ter problemas, por isso é perfeitamente possível fazer uma roadtrip sem incidentes.

Se estão de táxi, têm duas opções: ou exigem logo à partida que o táxi tenha o taxímetro visível e a funcionar (muito raro) ou negoceiam o preço antes de entrarem no táxi (a melhor opção). Este é um conselho central em Marrocos: negoceiem sempre de modo definitivo antes de entrarem num táxi, loja, aceitarem um serviço, bem, etc. Uma vez dentro do táxi, ou da loja, ou com o produto na mão, a negociação torna-se muito mais difícil e não é raro que o negociante se torne agressivo (verbalmente, não há qualquer risco, é só desagradável) se mudarem de ideias. Contem com 100-150 dirhams para o centro da cidade, que fica a 6 quilómetros (cerca de 20 minutos, com algum trânsito). Dentro da cidade, os táxis cobram geralmente 50 dirhams por viagem, qualquer que seja o sítio. Podem pagar em euros.

Também no alojamento têm uma opção difícil: ou vão para um bom hotel, no centro mais moderno de Marraquexe, ou ficam numa Riad na medina. São duas experiências radicalmente distintas. Até no preço. Os hotéis em Marrocos não são baratos, e a qualidade não corresponde exatamente aos padrões europeus (contem com uma estrela abaixo do indicado). Se estiverem de carro, escolham um hotel com estacionamento gratuito.

Se optarem por um hotel, o grupo Opera Plaza/Red, ou outros hotéis na mesma zona, são uma ótima opção. É uma zona moderna (Nouvelle zone touristique), muito segura, até para passear à noite, pois têm vários bares e clubes noturnos, fica perto de tudo, sempre de carro ou táxi, claro, já que as avenidas são muito longas e é difícil andar a pé com o calor (fica a 10 minutos da medina, 15 minutos do aeroporto, a 10 minutos de quase todos os pontos de interesse, e a 5 minutos de um centro comercial). Nós ficámos no Opera Plaza Hotel e adorámos. É um hotel de 4 estrelas e não fica aquém do esperado.

 

(Opera Plaza e Red Hotels – zona da piscina)

A decoração é muito bonita, sem exageros, e o hotel cheira deliciosamente bem. Tem estacionamento gratuito, uma boa piscina, ginásio, vários restaurantes (incluindo um restaurante italiano e outro asiático), bares, um clube noturno (com dança e espetáculos) e bowling. Tem também um SPA onde podem experimentar o Hammam, um banho tradicional turco e marroquino que inclui uma esfoliação, banho a vapor e piscina fria. Os quartos são bons e espaçosos (não consumam nada do que vos seja “oferecido” no quarto, incluindo o minibar, é muito caro) e têm ar condicionado (necessário!). Se quiserem juntar o moderno ao tradicional, e gostarem de fumar, podem sentar-se nas zonas laterais, junto à piscina e desfrutar do fim de tarde com chicha e cocktails.

Se optarem por uma experiência mais tradicional e quiserem ficar na medina (centro histórico), então vale a pena ficarem numa Riad. Riad é literalmente sinónimo de jardim, mas é atualmente utilizado no sentido de palacete ou casa de hóspedes. As Riads são casas tradicionais marroquinas, inseridas na medina, uma espécie de airbnb com mais carisma. Não se deixem enganar pelo exterior, pois o islão ensina a modéstia e a ostentação é mal vista. Por fora parecem pequenas e feias, mas por dentro, as boas Riads têm decorações magnificas e quartos sumptuosos. Muitas têm piscina e pequenos SPAs para Hammam. A partir de 40 euros por noite, dependendo da época e das comodidades, podem ficar numa Riad com piscina e pequeno almoço incluído, pelo que são a melhor opção do ponto de vista qualidade/preço. Como só ficámos em Riads em Fez, não posso dar sugestões para Marraquexe.

(Medina de Marraquexe – Praça Jemaa el-Fna)

Posso dar-vos alguns conselhos que se aplicam a qualquer estadia em Riads (ou Dars, que são parecidas, mas com menos comodidades), seja em Marraquexe ou Fez:

 – Antes de reservar, leiam os comentários de utilizadores. Leiam mesmo os comentários, não se limitem a ver a pontuação (há Riads com pontuações elevadas artificiais).

 – Caso tenham carro e/ou malas relativamente pesadas, escolham alojamento perto de uma das entradas nas medinas. As medinas são zonas confusas, com ruas apertadas, algumas onde não circulam carros e é difícil (quase impossível) estacionar lá dentro. Junto das entradas – a medina é uma zona central histórica rodada de muralhas, construída para proteger a população e desorientar os inimigos em caso de invasão – e há várias ao longo da muralha, existem zonas de estacionamento pago. O estacionamento é barato (um dia inteiro, 20 dirhams/2 euros). É aconselhável que a vossa Riad seja perto de uma das entradas, para estarem perto do carro (evitar carregar malas nas ruelas da medina) e para não se perderem… À cautela, liguem para a Riad quando estacionarem e peçam para vos mandarem alguém como guia, para não se perderem e saberem onde podem estacionar em segurança (caso a Riad não tenha um estacionamento oficial perto). Não tentem descobrir a Riad sozinhos, pelo menos sem a ajuda do google maps (não se esqueçam que funciona offline, desde que já tenham programado a viagem, e, mesmo sem programação, conseguem sempre ver onde estão). 

Não aceitem guias locais não indicados pela Riad que reservaram, para vos guiar até à Riad, é um serviço incluído na vossa reserva (gratuito), pelo que não precisam de pagar a outro guia, e há o risco de serem conduzidos a uma outra Riad (há Riads com nomes muito parecidos…).

 – Tentem optar por uma reserva sem pré-pagamento. Há relatos de utilizadores sobre duplas cobranças, mas o mais provável (as Riads que experimentámos eram absolutamente honestas) é tratar-se de erros de comunicação entre os agentes online e a Riad. Foi o que nos aconteceu em Fez, pelo que tivemos de pagar no local, apesar de já termos feito o pagamento online. Sem problema, pois a nossa anfitriã ligou para a booking, que nos confirmou a devolução do dinheiro, por email, em 5 minutos. À cautela, para evitar possíveis erros, é melhor pagarem no local. Guardem o registo do valor da reserva, não se esqueçam de que acrescem as taxas turísticas locais (cerca de 6 euros por noite) e preparem-se para pagar em dinheiro (a maioria das Riads não aceita cartão). Podem pagar em euros ou dirhams.

 – Nem todas as Riads disponibilizam sabonete, gel de duche ou shampoo, por isso o melhor é comprarem. Podem sempre pedir, algumas Riads disponibilizam apenas a pedido.

 – Relaxem e preparem o telemóvel: vão tirar fotografias magníficas nos cenários elaborados das Riads (ao lado, uma foto da Riad Soleil D’or – Fez).

Finalmente, chegámos a Marraquexe. Se não estiverem muitos cansados, podem “enfrentar” a Praça Jemaa el-Fna, a zona mais central da medina. Preparem-se para serem perseguidos por vendedores ambulantes e tentem seguir estes conselhos:

 – Vão ser recebidos por dezenas de solicitações e ofertas, numa mistura confusa de francês, árabe, inglês e espanhol. Pode ser desorientador, por isso, calma. Se se sentirem demasiado intimidados, retirem-se da zona central da praça (zona pior de solicitações) e aproximem-se de um café ou restaurante das zonas laterais, mais ocidentalizados, onde são menos proativos na perseguição ao turista. Uma boa forma de evitar as solicitações é responder apenas: “Merci, je connais déjà” (obrigada, mas já conheço). Outra boa forma de afugentar exploradores de turistas é responder, com ar inocente: “Oh, dear, I left my money at the Riad, just taking a walk”. De um modo geral, e já após algumas irritações, andávamos de telemóvel na mão e gritávamos “google maps” aos pretendentes a guias locais.

 – Cuidado com a simpatia. É uma pena ter de dizer isto, porque os marroquinos são muito simpáticos e prestáveis, mas em Marraquexe (e em Fez) é cauteloso não devolver as “simpatias”. A todo o momento alguém (quase sempre homens) vai meter conversa convosco e oferecer-vos ajuda: ajuda para circular na medina, para escolher um restaurante, para visitar algum sítio, etc. Não se esqueçam que, por mais simpática que vos pareça, essa ajuda não é gratuita. No fim do passeio, mesmo que dura 10 ou 15 minutos, podem cobrar-vos mais de 200 dirhams. E sim, ficam zangados se recusarem (mas podem recusar, ninguém vos faz mal, nós recusámos algumas vezes).

 – Se quiserem passear pela medina, levem um telemóvel com acesso à internet ou pré-programem alguns caminhos no google maps e vão seguindo a aplicação offline (também funciona assim). Marraquexe é uma cidade muito turística e a medina um centro de “caça” ao turista desprevenido. Se estiverem com um ar desorientado ou perdido, são presas fáceis. Se precisarem mesmo de ajuda, negoceiem antecipadamente um preço justo e podem beneficiar de um guia local por algumas horas: vai mostrar-vos os pontos de interesse na medina, contar-vos histórias, levar-vos às zonas melhores do mercado, etc.

 – Especial cuidado com os encantadores de cobras, treinadores de macacos e as senhoras que colocam uma espécie de tatuagens de hena nas mãos. Não se aproximem destes vendedores se não estiverem dispostos a pagar (não deem dinheiro aos senhores dos macacos, os bichos têm um ar profundamente infeliz). Eu fui “enganada” por uma senhora das tatuagens (vejam na foto, em cima). Depois de dizer insistentemente que não, “deixei”, por um segundo, que a senhora me agarrasse na mão (achei que era só um cumprimento local…) e pronto! Antes de perceber o que se passava já tinha a mão cheia daquela lama estranha. Exigiu-me 150 dirhams, consegui negociar para 75, mas depois cometi o erro de lhe dar uma nota de 100. Ah, ainda não tinha explicado? Também é comum usarem o argumento da falta de troco para ficarem com dinheiro a mais, por isso, quando trocarem dinheiro, peçam notas pequenas e moedas.

 – Cuidado com os guias para visitar as “tanneries” (zona de curtumes na medina, onde lavam e tinguem as peles). Começam por dizer que fazem parte da cooperativa e que vão só mostrar para facilitar a visita e no final pedem-vos 200 dirhams por vos levarem a ver uma coisa que é gratuita (não se paga para ver as “tanneries”, estão abertas ao público) e para vos levar à loja de peles da cooperativa. A única vantagem do guia é a oferta de hortelã para colocarem no nariz, pois as “tanneries” cheiram mal devido ao uso de caca de pombo para fixação da cor. Na loja, vão ser muito bem-recebidos e tratados até ao momento em que percebem que não vão gastar dinheiro. Nessa altura, ficam irritados e termina-se a simpatia. O nosso vendedor despediu-se com um sorriso sarcástico e a frase: “I knew, portugueses são tesos”… Como visitámos as “tanneries” tanto em Marraquexe como em Fez, achamos que as de Marraquexe não valem a pena. Já se quiserem mesmo comprar alguma coisa em pele, saibam que há muito mais escolha em Marraquexe, e produtos mais ricos, mas tudo é mais caro do que em Fez.

 – Sexta-feira é o dia Santo e de descanso, pelo que há muitas coisas fechadas. À tarde muitas lojas fecham. Á noite, porém, é uma festa imensa por toda a cidade e vale a pena acompanhá-los.

 – Existem gatos por todo o lado, e são amistosos, mas cuidado com as festinhas, têm pulgas…

O centro da medina é feito de mercados contínuos (pequenas ruas com lojas porta sim, porta sim). É um ótimo sítio para comprar peles, tapetes, peças de decoração, peças de vidro trabalhado, cobre, roupas tradicionais, especiarias, plantas medicinais e mezinhas locais. Podem e devem negociar, mas não esperem comprar coisas ao preço da chuva. Os preços do comércio e turismo são semelhantes aos nossos e não há grande margem de negociação em peças trabalhadas ou de bons materiais (e assim deve ser, é o trabalho e a forma de vida destas pessoas). Peçam sempre o preço antes de deixar que o vendedor embale o produto, e sejam insistentes, pois têm a tendência para não vos dizer o preço, vão adiando, conversando, oferecendo chá, mostrando outras coisas e, no final, têm uma conta de 1000 dirhams. São muito simpáticos e excelentes vendedores, por isso tentem não se deixar seduzir demais.

 

(Medina de Marraquexe – Praça Jemaa el-Fna)

Em volta dos mercados há restaurantes com terraços e uma das grandes atrações é ficar a ver o por-do-sol de um dos terraços (a Praça Jemaa el-Fna fica bonita com a iluminação noturna). Claro, os preços são inflacionados e a comida é banal (tagines, que são assados tradicionais de carne ou legumes, e couscous com carne e/ou legumes), mas vale pela experiência, até porque às 19h/20h é dado o sinal da reza e a praça fica quieta a ouvir os cânticos religiosos durante alguns minutos. Come-se melhor, e mais barato, nos restaurantes mais afastados da praça e do centro. Gostámos particularmente do Terrace La Medersa, situado ao pé da Madrassa (Medersa) bem Youssef.

(Terrace La Medersa – Medina Marraquexe)

Não há muito para ver em Marraquexe no que respeita a monumentos e museus. O que torna Marraquexe fascinante é a experiência cultural. Podem ver os Túmulos Saadianos e o Palácio el Badi, mas os primeiros não impressionam (particularmente a quem conhece bem os vestígios árabes no sul de Portugal e Espanha) e o segundo consiste apenas numa muralha (basta ver por fora e não vale o preço do bilhete). O mais bonito, a mesquita e o Palácio Real só podem ser vistos por fora. Em Marrocos, aliás, os turistas não podem entrar nas mesquitas.  A Madrassa Bem Youssef é bonita, e pode ser visitada, mas está em fechada para obras de renovação. Vale a pena ir ver os Jardins Majorelle, mais pelas cores da vegetação, e por serem um local mais fresco e agradável em dias de maior calor.

(Jardins Majorelle, Túmulos Saadianos e Bab Er Robb, uma das portas mais bonitas)

Se quiserem ter a experiência completa, devem ir jantar a um restaurante com espetáculos. Existem vários, os principais são o Comptoir Darna, o Palais Jad Mahal, o Chez Ali, e o Palais Dar Soukkar. Optámos pelo Palais Dar Soukkar por ser fora da medina, numa zona nova e mais moderna da cidade, podermos comer ao ar livre (estava muito calor, mesmo à noite) e por ter parque de estacionamento gratuito. O Palais é também menos turístico do que os restantes e mais frequentado por locais (classe média alta marroquina). Nestes restaurantes, os pratos custam entre 20 a 25 euros, os vinhos e cocktails são caros, contem, em média, com 30-40 euros por pessoa. A comida é boa, sem ser excelente, mas o que vale mesmo a pena é o espetáculo e o ambiente. O Palais Dar Soukkar era uma antiga fábrica de açúcar e está decorado magnificamente. O objetivo é recriar um palário real tradicional marroquino e conseguem mesmo transportar-nos para um cenário das mil e uma noites. O espetáculo no Palais Dar Soukkar inclui a tradicional dança do ventre, dança tradicional masculina, dança tradicional do sul de Marrocos e engolidores de fogo (podem ver alguns vídeos oficiais aqui).

Por fim, se forem a Marraquexe, tentem ir ao deserto. Infelizmente não pudemos ir, pois o deserto mais perto, em Merzouga, ficava a mais de 9 horas de distância. Para irem ao deserto convém ficarem 3/4 noites em Marraquexe, pois precisam de 2 dias (1 noite no deserto) para fazer esta extensão. Posso – porque andámos de camelo – deixar o aviso: a não ser que estejam em ótima forma física e tenham boa resistência ao calor, não façam as tours de camelo. Há tours que são feitas integralmente de camelo, são muitas horas em cima de um camelo, expostos ao sol, areia, vento… O ideal é fazerem as tours de jipe e, uma vez no deserto, fazerem um pequeno passeio de camelo. Deixo alguns sites onde podem ver preços e sugestões: “Rita em Marrocos”, Marrocos.com, Viagens Marrocos, Visit Marocco, Travel Marrocos.

 

 

Nota sobre a autora

Inês Ferreira Leite

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